A última página
28.10.09
Fechara um livro pela última vez por suas mãos. Pronto a desfrutar a eternidade das histórias que sabia de cor. Drummond disse: "Penetra surdamente no reino das palavras" e ele foi, morrer-viver no encantamento. Viver de contos, romances. Padecer no céu do silêncio gritado de tantos amores e dores sufocadas nas páginas que tanto lera.
Morrer já não era medo, era descanso e descaso com quem o pedira tanto para não partir. Morrer era, enfim, fechar a capa do próprio livro depois do último parágrafo completo.
Seu último parágrafo solitário e satisfeito. De um livro de tantas páginas, algumas manchadas, rasgadas, algumas arrancadas e outras apagadas pelo tempo de vida, mas todas escritas e vividas, todas passadas.
Se sua vida fora livro, ou seus livros deram vida a monotonia diária, não sabia, de certo que tudo fora uma coisa só porque pra ele o tempo não passou, apenas as páginas viraram uma a uma. Foi Dom Casmurro, foi Drácula, foi Abelardo I e até Brás Cubas. Até hoje não se sabe quem ele foi ao certo.
Concentração de monge, olhos atentos e rápidos, agora fechados e mergulhados no infinito indescritível e inimaginável chamado morte, indefinido mutável que nem em seus preciosos livros ele pôde descobrir o que era.
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