Sobre a sinestesia de La La Land e a felicidade de encontrar algo que nem sabia ter perdido

31.1.17


La La Land começa e me sinto assistindo a cena de abertura de 8½. Mas mergulho em um outro sonho que não o de Fellini.

Quem me convida a dançar é Damien Chazelle. Sou cortejada com cores vibrantes e uma imperfeição que só um perfeccionista como ele poderia criar. A música acaricia os meus ouvidos e ele me estende a mão para então ser carregada história adentro. 

E tudo se mistura, realidade e ficção, em um momento os personagens sonham acordados, noutro parecem cochilar sobre a realidade fatídica. E eu não sei quando e o que, e nem preciso saber. 

Uma história comum de "garoto encontra garota", colorida com tantas nuances fotográficas e graça, com uma sustância musical tão aprimorada que nem me importo com o lugar-comum do roteiro.  

E quando percebo, sorrio de orelha a orelha mesmo sem ter sabido em que momento isso começou.  E chego a prender a respiração nos momentos que me faltam pensamentos lógicos. Viajo numa sinestesia tão grande que extasio numa explosão de bons momentos; sinto o gosto das cores que se derramam na grande tela, chego a sentir o cheiro do som que irrompe o sistema de som do cinema. Viajo, sem nem sair da minha poltrona e esqueço que era uma terça-feira e que a vida não parava de pulsar na avenida apinhada de carros que transitam a menos de 1km metros atrás de mim.

O que é e como é La La Land, eu não sei explicar. Só sei o que sinto. E saio nas ruas pairando levemente sobre o chão, ouvindo a buzina dos carros na Avenida Paulista, um músico que toca blues em frente ao shopping, as pessoas que andam de um lado pra outro e os que vão a lugar algum. Sorrio, mesmo depois de deixar o cinema, sorrio.

Sorrio porque me lembro a razão pela qual me apaixonei pelo cinema e pelo privilégio de contar histórias que embaçam a linha tênue entre o real e o imaginário. Sorrio porque me lembro de como Barbra Streisand, Gene Kelly, Mickey Rooney, Ginger Rodgers, Liza Minnelli, e tantos outros sempre resgatam em mim aquela alegria sincera, quase infantil. Sorrio pela visceralidade do jazz que ainda penetra meus ouvidos e fez de mim inquieta na poltrona da sala.

Ao sair da sessão, me arrisco a perguntar se a vida ainda é essa complexidade toda que eu refletia antes de entrar. Os 128 minutos que Chazelle produz só podem ser produto de sonhos indecifráveis. Arrisco a dizer que a película se registra aos poucos em mim, ao mesmo tempo que se perde na euforia do que vi e nunca mais verei com novos olhos. Damien colore meus pensamentos e reaquece um sentimento de pertencimento já tão esquecido em mim; o cinema, o jazz e o amor - no mais inveterado dos sentidos - me fazem lembrar de quem sou e há tempos não encontrava em mim: alguém que acredita. 

Recarregada de amor pela arte e pelo amor, eu caminho cidade afora com os acordes de "City of Stars" ainda ecoando em meus ouvidos. 

QUE TAL MAIS UM?

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