O mar bate sereno na faixa marfim que se perde no horizonte. Meus pés afundam em areia fofa, e o calor que emana dela me traz uma leve embriaguez. Há um chiado característico das ondas que se faz música de ninar em meus ouvidos. O mundo, enfim, gira em câmera lenta.
Minha pequenez perto da imensidão azul
safira que avança para beijar-me os pés, ludibria-me tanto que penso ser dona
de um mini-reino de conchas e grãos de areia dourados.
O céu se contrapõe em um tom sobre tom
acima do mar e a tela se divide em dois, como um quadro de Piet Mondrian, num
cubismo perfeito de linhas retas; apenas as gaivotas causam espaçados borrões
ao azul turquesa profundo e uniforme. Sob as lentes marrons, minhas pupilas
contraem diante da grande bola iluminada que irradia sobre tudo, é quase dor,
olhar diretamente para o sol que queima.
O vento contorna minha forma
desleixada sobre a esteira, e sinto que todos os problemas do mundo são
infundados quando olho adiante, ao perder de vista. Não há problemas que não tenham
solução diante da calmaria de um mar em movimento.
Meus olhos se fecham involuntariamente
agora. Meu corpo quer entrar em um semi-coma para preservar essa paz de
espírito que irriga minha mente. As ondas me dizem que está tudo bem, o vento me
cobre de calmaria. Sinto-me viva, em cada pedacinho de corpo que sou, no
tintilar do sangue que corre em mim. Sorrio e inspiro a brisa salgada que vem
dum outro mundo qualquer, é cheiro de frescor.
Antes de adormecer no sono dos justos,
sob o grande ombrelone que me guarda dos raios mais intensos do sol da manhã, ainda
me permito uma última reflexão difusa: como pode o homem esperar pelo paraíso
quando ele está tão presente aqui, nesse momento? Por que esperar por uma
tranquilidade eterna, se há, em vida, uma calmaria tão absorta e significante?