fonte: iwdrm
O corpo desperta aos poucos sob as quatro camadas de cobertores. Os olhos semicerrados voltam a pousar os cílios sobre as maçãs do rosto porque sonhar é mais importante do que estar acordado. O canto de um pássaro qualquer é tão alto e claro que parece pousado em suas orelhas.
Os raios do sol de inverno atravessam as frestas das lâminas de madeira da persiana e iluminam a poeira que paira no ar – eles iluminam, mas não chegam a aquecer. Quer adormecer de novo, e permanecer dentro do R.E.M.
O celular vibra na cabeceira, ele vira para o outro lado. O aparelho volta a vibrar e ele mergulha a cabeça no mar de travesseiros – o resmungo sai abafado. Por um instante permanece imóvel, conta a respiração, aguarda que o torpor do sono venha busca-lo novamente; espera que o quarto caia em um breu profundo.
Os pés tornam-se inquietos, roçam os lençóis de um lado ao outro. As calças do pijama aglomeram na altura dos tornozelos. O que era conforto vira tortura. O coração bate com força contra as costelas, o som dos passarinhos fica abafado pelo forte pulsar nos tímpanos. O sono está abandonado – o sonho escapa por entre os dedos para se alojar naquela prateleira no alto da estante, onde ele não consegue alcançar.
Abre uma fresta livre de cobertores, expõe parte do corpo à temperatura ambiente. As pálpebras se espremem com força umas contra as outras agora. Ouve o carro do vizinho engasgar pela primeira vez na manhã, e sabe que ele precisará de mais 7 ou 8 partidas para fazê-lo ligar. As palmas das mãos suam sob os travesseiros. Solta um ar engasgado pela boca e aceita a derrota de estar acordado, enfim.
Arrasta-se para fora da cama, uma perna, depois a outra. Arrasta-se até estar em pé, de frente para a porta, a caminho do banheiro.
O restante da manhã vai passar como um borrão, tão igual a todos os dias anteriores e os que ainda virão. Vai haver aquelas janelas de felicidade durante o dia, quando sonha acordado: no ônibus, olhando para os e-mails sem lê-os, durante uma reunião para resolver que é preciso de outra reunião para resolver nada e coisa nenhuma.